Page 24 - Revista Portuguesa de Buiatria - Nº 23
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A transmissão ocorre por forma direta através   aumento do número de células somáticas no leite
            do contato direto com fluidos fetais, placenta, cor-  (Meador e Deyoe, 1989). Touros infetados podem
            rimentos vaginais, leite, sémen, fluidos seminais   desenvolver sinais sistémicos de infeção, incluin-
            e urina, mas também através do contacto com o   do febre, anorexia, depressão, embora a infeção
            agente aerossolizado. A transmissão venérea é   seja usualmente discreta ou inaparente. A lesão
            bastante comum, porém a entrada do agente é     mais significativa em touros é a orquite que está
            também possível pela via oral, respiratória e con-  normalmente associada a vesiculite seminal e
            juntival. Médicos veterinários apresentam elevado   epididimite. Como resultado de orquite crónica e
            risco de infeção quando em contacto com animais   fibrose do parênquima testicular, os touros afeta-
            infetados e aerossóis formados a partir de vacinas   dos podem sofrer infertilidade permanente (Rh-
            (OIE, 2022).                                    yan et al., 1997). A brucelose deve ser distinguida
               Brucella não se multiplica fora de um hospe-  de outras doenças zoonóticas que causam aborto
            deiro mamífero, mas pode sobreviver entre 150 a   em bovinos, tais como, Leptospirose, Clamidiose,
            240 dias abaixo de 5°C, se protegida de disseca-  Febre Q e Campilobacteriose. Os sinais da infe-
            ção, em fetos abortados, estrume e água (God-   ção  em  bovinos,  dependem  de  vários  fatores,
            froid et  al., 2013; Pessegueiro  et al., 2003). A   nomeadamente idade, estado reprodutivo e imu-
            transmissão pode ser ampliada num efetivo atra-  nitário, resistência natural, via de infeção, virulên-
            vés da infeção de espécies silváticas que funcio-  cia e estirpe infetante (Adams, 2002; Neta et al.,
            nam como reservatório ou espécies de spillover   2010).
            ou transbordamento (Confalonieiri, 2010). Estas    Sendo os sinais de brucelose não patognomó-
            últimas são espécies silvestres que não sustêm   nicos nos bovinos nem na fauna selvagem, o
            infeção sem exposição recorrente ao agente, mas   diagnóstico definitivo depende de testes labora-
            que podem contribuir para a reintrodução da     toriais. A escolha da estratégia de diagnóstico
            doença nos bovinos através da contaminação      depende da prevalência de brucelose numa re-
            ambiental (Simpson et al., 2021).               gião ou país. Métodos diretos incluem coloração
               A infeção por Brucella em bovinos é normal-  com método de Ziehl-Neelsen modificado, reali-
            mente causada por biovares (organismos com      zado em membranas fetais, o qual tem baixa es-
            genética idêntica, mas que diferem em caracte-  pecificidade, dado que se obtêm resultados
            rísticas bioquímicas e fisiológicas) de Brucella   semelhantes para Chlamydophila abortus (antiga
            abortus, apesar de bovinos mantidos em contacto   Chlamydia psittaci) e Coxiella burnetii; cultura
            próximo com ovelhas e cabras também poderem     bacteriana em secreções vaginais, colostro, leite,
            ser infetados com B. melitensis. Ocasionalmente,   ou estômago, baço e pulmão de fetos abortados,
            Brucella suis pode também causar uma infeção    em membranas fetais, esperma e fluido colhido
            crónica da glândula mamária dos bovinos, mas    de artrites ou higroma, ou órgãos genitais, baço
            não está provado que possa causar aborto ou     e linfonodos orofaríngeos, ilíacos, escapulares,
            disseminar-se pelos animais (OIE, 2022).        crurais, supramamários/testiculares em ambiente
               A doença em bovinos apresenta manifesta-     de matadouro (Godfroid et al., 2010), técnica com
            ções clínicas associadas a problemas reproduti-  elevada sensibilidade; e Reação em cadeia da
            vos, sendo o sinal clínico mais comum o aborto   polimerase (PCR) em todos os tecidos acima re-
            (Godfroid, 2002; Pappas e Papadimitriou, 2007).   feridos para identificação e tipificação molecular,
            Um episódio de aborto por Brucella não põe em   considerado atualmente o método gold standard
            risco o sucesso das seguintes gestações e par-  (Le Flèche et al., 2006), o qual apresenta uma
            tos. Novilhas infetadas podem abortar ou parir   sensibilidade mais baixa que a cultura, mas uma
            vitelos infetados, o que é muitas vezes a razão   especificidade que pode chegar aos 100%, de-
            para a manutenção da doença no efetivo (Jones   pendendo das amostras e da espécie animal con-
            et al., 1980). Vitelos nascidos de mães seroposi-  siderada (Bricker, 2002).
            tivas podem permanecer serologicamente nega-       Os métodos indiretos ou métodos imunológi-
            tivos e não revelar sinais de doença. Tal pode   cos detetam a resposta imunológica do indivíduo
            dever-se à proteção passiva e incapacidade de   ao antigénio de Brucella spp. e não a presença
            estabelecimento de infeção ou recuperação de    da bactéria em si. São realizados globalmente
            infeção, com posterior declínio de anticorpos ma-  com muita frequência devido à sua simplicidade
            ternais. Ainda assim, estes vitelos devem ser con-  de execução e interpretação em amostras de leite
            siderados infetados (Shirima, 2022).            ou soro, e incluem Teste de Rosa Bengala (RBT),
               Outros sinais clínicos de infeção em fêmeas   Teste do anel em leite (MRT), Teste de aglutina-
            bovinas incluem redução na produção de leite e   ção de Brucella (BAT), Teste de fixação do com-


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