Page 31 - Revista Portuguesa de Buiatria - Nº 23
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celose ao longo das testagens feitas, em diferentes   mostram que animais de idades variáveis apre-
            meses do ano. É de notar que a maioria dos diag-  sentaram infeção por Brucella spp., o que está de
            nósticos positivos ocorreu em julho de 2019 (n=51;   acordo com a literatura científica (OIE, 2022).
            52,6%), seguindo-se setembro de 2019 (n=9;      Nesta exploração, estes resultados não surpreen-
            9,3%). Esta diferença de seropositividade nos di-  dem, visto que vitelos podem permanecer com as
            ferentes meses do ano revelou-se estatisticamen-  mães até cerca dos 12 meses de idade, o que
            te significativa (p<0,001).                     propicia a infeção entre animais mais velhos e
                                                            mais jovens. A relação do sexo com seropositivi-
                                                            dade, demonstra que a prevalência desta doença
            Discussão                                       é mais incidente nas fêmeas, como vários autores
                                                            já o demonstraram (Mangi, 2015; De Alencar Mota
               Desde o aparecimento do primeiro caso de     et al., 2016), o que pode ser explicado pela sepa-
            brucelose, o produtor seguiu as instruções dadas   ração dos machos durante o período de maneio
            pela DSVRA. O primeiro animal seropositivo foi   do surto de Brucelose e a possibilidade de novas
            isolado nas instalações do produtor e foi retesta-  infeções por transmissão direta no grupo das fê-
            do para confirmação de seropositividade, onde   meas e não dos machos.
            permaneceu até ser recolhido para um centro de     O período de verão, nomeadamente os meses
            abate. O reaparecimento dos casos na explora-   de julho e setembro foram aqueles que apresenta-
            ção em julho de 2018 foi o fator de maior impacto   ram maior número de testagens positivas, o que
            para o produtor devido ao sequestro do efetivo e   pode ser explicado pelo início da época de pari-
            à impossibilidade de vender qualquer animal du-  ções na exploração. Visto que abortos por Brucella
            rante meses, limitando assim o retorno económi-  são mais comuns na segunda metade da gestação
            co da exploração. Com isto, a disponibilidade   (Godfroid et al., 2013), poderá ter ocorrido expulsão
            financeira para manter e investir no seu efetivo   de fetos infetados não detetados pelo produtor, e
            também ficou reduzida, e consequentemente o     aumentado o risco de infeção para outros animais.
            estado geral do efetivo veio a piorar ao longo do   Estas possíveis infeções terão levado a serocon-
            tempo, com necessidade de atuação médico-ve-    versão nas semanas seguintes e testagem positiva
            terinária aquando das testagens para resolução   nesta altura do ano. A emergência de novos casos
            de situações clínicas como abcessos podais,     seropositivos durante os meses do estudo e após
            diarreia e baixa condição corporal, prolapsos ute-  a vacinação do efetivo com RB51 não seria espec-
            rinos, queratoconjuntivite infeciosa e dermatofito-  tável, pois a imunização deveria proteger contra
            se severa e desnutrição em vitelos devido à     novas infeções sem provocar aborto e placentite
            eliminação das suas progenitoras. É sugerido    em animais gestantes, apesar de poder haver fa-
            pelos autores que a ocorrência destas situações   lhas de imunização com apenas uma administra-
            clínicas se deveu à diminuição da suplementação   ção (Olsen, 2000). Tal pode sugerir que alguns
            alimentar do efetivo que secundariamente, levou   animais poderiam já estar infetados antes da idade
            a imunodepressão, e à desmotivação por parte    de testagem (6 meses) ou que a resposta imuno-
            do produtor de detetar e tratar animais doentes.   lógica à vacina foi fraca em alguns animais.
               O cálculo da prevalência foi feito através do   Existem vários fatores que podem estar asso-
            número de amostras positivas sobre o número     ciados ao reaparecimento da doença nesta explo-
            total, o que pode não refletir a prevalência real no   ração, nomeadamente a presença de fauna
            efetivo, visto que apenas animais com mais de 6   selvagem, a dificuldade de deteção de abortos
            meses (salvo exceções de vitelos filhos de vacas   dado o regime extensivo da exploração, o contac-
            positivas) foram testados. Com isto, a prevalência   to com efetivos bovinos de zonas contíguas devi-
            de 4% pode estar sobrestimada, visto que se fos-  do a danos nas infraestruturas que separam os
            se calculada a prevalência com base no número   animais (cercas de arame farpado, portões), a
            de animais infetados sobre a população total do   presença de cursos de água provenientes de ex-
            efetivo, este valor pudesse ser mais baixo. Ani-  plorações vizinhas, e a ausência de testagem de
            mais testados com um mês dizem respeito a vite-  animais com idade inferior a 6 meses (Tulu, 2022).
            los cujas mães testaram positivo e os quais     Um dos pontos que parece ser de relevância é
            tiveram igualmente de ser testados, por risco de   que, neste efetivo, as fêmeas apenas eram postas
            contágio através do leite e outras secreções, ape-  à cobrição aproximadamente aos 3 anos e isso
            sar da incerteza associada a seronegatividade   poderia estar a retardar o aparecimento de sinto-
            nestes animais e daí deverem ser considerados   matologia reprodutiva; ou este facto era uma con-  N. o  22, Dezembro 2023
            infetados (Shirima, 2022). Os dados deste estudo   sequência da presença de infeção não detetada


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