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celose ao longo das testagens feitas, em diferentes mostram que animais de idades variáveis apre-
meses do ano. É de notar que a maioria dos diag- sentaram infeção por Brucella spp., o que está de
nósticos positivos ocorreu em julho de 2019 (n=51; acordo com a literatura científica (OIE, 2022).
52,6%), seguindo-se setembro de 2019 (n=9; Nesta exploração, estes resultados não surpreen-
9,3%). Esta diferença de seropositividade nos di- dem, visto que vitelos podem permanecer com as
ferentes meses do ano revelou-se estatisticamen- mães até cerca dos 12 meses de idade, o que
te significativa (p<0,001). propicia a infeção entre animais mais velhos e
mais jovens. A relação do sexo com seropositivi-
dade, demonstra que a prevalência desta doença
Discussão é mais incidente nas fêmeas, como vários autores
já o demonstraram (Mangi, 2015; De Alencar Mota
Desde o aparecimento do primeiro caso de et al., 2016), o que pode ser explicado pela sepa-
brucelose, o produtor seguiu as instruções dadas ração dos machos durante o período de maneio
pela DSVRA. O primeiro animal seropositivo foi do surto de Brucelose e a possibilidade de novas
isolado nas instalações do produtor e foi retesta- infeções por transmissão direta no grupo das fê-
do para confirmação de seropositividade, onde meas e não dos machos.
permaneceu até ser recolhido para um centro de O período de verão, nomeadamente os meses
abate. O reaparecimento dos casos na explora- de julho e setembro foram aqueles que apresenta-
ção em julho de 2018 foi o fator de maior impacto ram maior número de testagens positivas, o que
para o produtor devido ao sequestro do efetivo e pode ser explicado pelo início da época de pari-
à impossibilidade de vender qualquer animal du- ções na exploração. Visto que abortos por Brucella
rante meses, limitando assim o retorno económi- são mais comuns na segunda metade da gestação
co da exploração. Com isto, a disponibilidade (Godfroid et al., 2013), poderá ter ocorrido expulsão
financeira para manter e investir no seu efetivo de fetos infetados não detetados pelo produtor, e
também ficou reduzida, e consequentemente o aumentado o risco de infeção para outros animais.
estado geral do efetivo veio a piorar ao longo do Estas possíveis infeções terão levado a serocon-
tempo, com necessidade de atuação médico-ve- versão nas semanas seguintes e testagem positiva
terinária aquando das testagens para resolução nesta altura do ano. A emergência de novos casos
de situações clínicas como abcessos podais, seropositivos durante os meses do estudo e após
diarreia e baixa condição corporal, prolapsos ute- a vacinação do efetivo com RB51 não seria espec-
rinos, queratoconjuntivite infeciosa e dermatofito- tável, pois a imunização deveria proteger contra
se severa e desnutrição em vitelos devido à novas infeções sem provocar aborto e placentite
eliminação das suas progenitoras. É sugerido em animais gestantes, apesar de poder haver fa-
pelos autores que a ocorrência destas situações lhas de imunização com apenas uma administra-
clínicas se deveu à diminuição da suplementação ção (Olsen, 2000). Tal pode sugerir que alguns
alimentar do efetivo que secundariamente, levou animais poderiam já estar infetados antes da idade
a imunodepressão, e à desmotivação por parte de testagem (6 meses) ou que a resposta imuno-
do produtor de detetar e tratar animais doentes. lógica à vacina foi fraca em alguns animais.
O cálculo da prevalência foi feito através do Existem vários fatores que podem estar asso-
número de amostras positivas sobre o número ciados ao reaparecimento da doença nesta explo-
total, o que pode não refletir a prevalência real no ração, nomeadamente a presença de fauna
efetivo, visto que apenas animais com mais de 6 selvagem, a dificuldade de deteção de abortos
meses (salvo exceções de vitelos filhos de vacas dado o regime extensivo da exploração, o contac-
positivas) foram testados. Com isto, a prevalência to com efetivos bovinos de zonas contíguas devi-
de 4% pode estar sobrestimada, visto que se fos- do a danos nas infraestruturas que separam os
se calculada a prevalência com base no número animais (cercas de arame farpado, portões), a
de animais infetados sobre a população total do presença de cursos de água provenientes de ex-
efetivo, este valor pudesse ser mais baixo. Ani- plorações vizinhas, e a ausência de testagem de
mais testados com um mês dizem respeito a vite- animais com idade inferior a 6 meses (Tulu, 2022).
los cujas mães testaram positivo e os quais Um dos pontos que parece ser de relevância é
tiveram igualmente de ser testados, por risco de que, neste efetivo, as fêmeas apenas eram postas
contágio através do leite e outras secreções, ape- à cobrição aproximadamente aos 3 anos e isso
sar da incerteza associada a seronegatividade poderia estar a retardar o aparecimento de sinto-
nestes animais e daí deverem ser considerados matologia reprodutiva; ou este facto era uma con- N. o 22, Dezembro 2023
infetados (Shirima, 2022). Os dados deste estudo sequência da presença de infeção não detetada
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